18 de Dezembro de 2019
Num dia marcado pela chegada ao Continente da tempestade Elsa, o desporto voltou a falar mais alto e a paixão pela equipa alvinegra fez deslocar ao final da tarde uma franja de adeptos “Desnorteados” à capital do móvel para uma partida da equipa sénior nos Oitavos de final da Taça de Portugal. Já com o chegar da noite e em que muitos cidadãos acompanhavam o jogo entre o Sport Lisboa e Benfica e o Sporting Clube de Braga, um grupo de espinhenses viajou até à vizinha terra de Esmoriz para apoiar a equipa sénior feminina que parece querer fazer da nova temporada – imaculada!
As pupilas de Tiago Rachão entraram fortes e determinadas no primeiro set e o ambiente criado na bancada do Pavilhão 2 – fez com que a equipa fechasse o resultado em 17 – 25. A equipa da casa não se deixou abater e proporcionou uma linda segunda partida – levando a discussão para as vantagens de dois pontos, fechando a seu favor à primeira oportunidade (27 – 25). Mudança de campo e uma atitude idêntica do tigre na terceira partida – acabando por conseguir fazer uma “segunda versão” do primeiro set, ficando assim a vencer por 1 – 2 com um parcial de 17 – 25.
O quarto e decisivo set teve momentos de bom voleibol por parte das duas equipas, mas começou de forma mais crispada com o primeiro árbitro a exibir um cartão amarelo à camisola 2 da equipa local e tendo sido necessária a intervenção do juiz de mesa. Tal “incidente” não abalou o Esmoriz que conseguiu aproveitar as distrações e erros “não forçados” da turma alvinegra tendo conseguido por duas ocasiões “encostar-se” ao Sporting Clube de Espinho em situação de vantagem de quatro pontos, mas uma eficácia ao nível do serviço, ataque e rede permitiu fechar o jogo e carimbar a passagem a mais uma fase decisiva da Taça.
Fez do foyer do Cineteatro António Lamoso a sua sala de estar. Desprotegido(s) de engenharias de som do século XXI, Renato Ferreira e David Eusébio levaram as largas de dezenas de pessoas por uma viagem sem sobressaltos ou feedbacks e estenderam a noite em amena cavaqueira com os amigos e curiosos que – apesar da chuva e frio – encheram as cadeiras do renovado espaço cultural no centro da cidade. Conheci o Renato há vários anos e pontualmente bebemos um café entre os livros na FNAC do Gaia Shopping, portanto a presença naquela noite era – além de uma honra e um privilégio – uma oportunidade de ouvir um amigo actuar em casa. Conheço bem a sensação de bem-estar por tocar num edifício do nosso concelho, e para o Renato não foi excepção. O David viajou de Leça da Palmeira e foi também um regresso aos tempos musicais de TAF. Trouxe consigo um Ukelele da Ortega e a “eterna menina dos meus olhos” Martin.
1 – Renato, obrigado por teres aceite o convite da Focal Point para um balanço, não só do concerto no António Lamoso mas também para falar um pouco sobre a tua carreira. Uma vida sempre ligada às letras?
– Muito obrigado, Francisco, por esta entrevista e pela tua presença no concerto de apresentação do álbum “3” no Cineteatro António Lamoso, no passado dia 20 de novembro. Respondendo agora à tua pergunta, direi que não. Não estive sempre ligado às letras. Às letras de canções sim, sempre me senti ligado a elas e desde novo que tentei construir as minhas. Mas se quisermos dividir o mundo em letras e/ou números, tenho que me lembrar do meu percurso escolar: antes de me dedicar às letras dediquei-me aos números também. Até aos 20 anos de idade estudei mais matemática, física e química do que propriamente português ou história. Aos 20, tendo mudado de Engenharia Mecânica para Ciências da Comunicação, é que diria que começou a minha relação mais próxima com as letras…
2 – Sendo a escrita de canções uma arte, ela é exponencial a quanto – sendo escrita em português!?
Sendo escrita em português a canção fica mais próxima de mim. Isto porque é a língua que utilizo diariamente para entender e ser entendido. Por isso diria que, apesar de considerar arte a escrita de canções em qualquer língua, a maneira de me colocar mais exposto perante quem me ouve – e haverá certamente vantagens e desvantagens em me colocar mais exposto – é compondo em português. Essa exposição é um despir mais acentuado porque utilizo a mesma matéria-prima que utilizo quotidianamente para me dirigir ao outro. Dominando mais o português do que qualquer outra língua, é natural que a minha expressão seja superior compondo em português, conseguindo com isso uma maior amplitude de temas e palavras para descrever seja o que for que a canção pretenda transmitir.
3 – Como vês o panorama da música que passam actualmente nas rádios em Portugal?
Temos muitas rádios a passar música distinta. Isso é bom porque assim cada um escolhe o que quer ouvir, mediante o seu gosto. Eu sou ouvinte regular de rádio e, quer se queira quer não, é um veículo fundamental para dar mais ou menos (ou nenhuma) projecção a um cantautor ou grupo. É um dos principais filtros que decidem o que se ouve em termos musicais no país. São elas que põem a maioria das músicas na cabeça das pessoas levando-as a cantar essas músicas posteriormente em concertos, num ciclo musical que eu não critico. Pelo contrário, apoio, uma vez que a alternativa – não existir esse ciclo – seria bem pior. Mas a música não vive só nas rádios, claro, e hoje em dia cada um pode construir, enquanto ouvinte, o percurso que bem entender no fruir musical…
4 – A escrita de uma letra de canção nasce em que circunstâncias? Em frente ao computador, numa mesa de um café, no trânsito…?
No meu caso, tem surgido quase invariavelmente em casa, quando estou sozinho, e primeiro na cabeça simplesmente. Começo normalmente uma canção com uma frase-chave, à qual dou uma melodia que a acompanhe, e a partir daí a coisa nasce, quando nasce. Mas nunco me autodetermino a fazer uma canção. Elas aparecem assim quase sem avisar. E eu, quando elas teimam em aparecer, simplesmente abro-lhes a porta.
5 – Que autores não dispensas ler? E já agora, achas que um curso de escrita criativa é a bóia de salvação para o futuro das canções?
A tua pergunta leva-me a dois universos em princípio distintos: ao da literatura e ao da música. Felizmente, para mim, esses dois universos não vivem em salas fechadas um para o outro. Há entre eles comunicação, obviamente. Para responder com exemplos concretos à tua pergunta, tenho mesmo que dizer que não dispenso ler Paul Auster, Javier Marías, Jonathan Franzen, Enrique Vila-Matas ou o Jonathan Coe… Mas como podes reparar, nenhum deles canta (que eu saiba) aquilo que escreve. Mas esses são os autores que eu não dispenso ler. Também há autores que eu não dispenso ouvir: o Bob Dylan, o Leonard Cohen, o Pedro Abrunhosa, a Mafalda Veiga ou a Márcia…entre muitos outros. Quanto aos cursos de escrita criativa, acho que podem ser positivos, claro. Mas nunca como imposição de um estilo a alguém mas simplesmente como forma de partilha de experiências para que cada um consigo encontrar o seu caminho, a sua forma e estilo de fazer a própria obra…à sua maneira…
6 – O Cine-Teatro António Lamoso recebeu-te de braços abertos, como se da tua sala de estar se tratasse. Que balanço fazes desta noite acompanhado pelo teu amigo David Eusébio?
Faço um balanço positivo, sem dúvida. A minha perceção diz-me que correu bem e o feedback que recebi de quem esteve presente leva-me a acreditar que consegui atingir o objectivo. Apresentar o “3” e ao mesmo tempo fazer com que os presentes pensassem que valeu a pena a ida ao Cineteatro António Lamoso era o objectivo. Espero ter conseguido. O facto de ter contado com o profissionalismo, a entrega, o saber musical e a simpatia do amigo David Eusébio foi para mim uma alegria imensa e um contributo indispensável para esta minha apreciação positiva.
7 – Apresentar um álbum ao mundo é um risco. Que momentos foram só teus neste percurso?
Essencialmente os momentos de criação das músicas. Esses são os momentos mais individuais a partir do qual tudo nasce. Depois desses momentos vem todo um percurso de conjugação de vontades, estilos, agendas e trabalho em equipa. Depois do trabalho de criação das músicas – que para mim tem sido um trabalho solitário, de uma solidão boa que eu procuro ter de vez em quando para meu próprio bem – vem o processo de produção e gravação em estúdio. Nesta fase seguinte, tendo contado eu com a colaboração preciosa de vários talentosos músicos, entre os quais os produtores Luís Ribeiro e Bruno Violas, quase direi que apresentar este álbum deixa por isso de ser um risco, mas simplesmente um prazer – uma vez que o entusiasmo e o carinho do caminho para o fazer tem tanta importância do que o que dirão dele posteriormente. Embora, claro está, se gostarem dele mais contente fico…
8 – Antes de apresentares os temas do teu mais recente trabalho #Três fizeste uma viagem aos anteriores projectos / composições. Olhando para trás, mudarias algo na carreira?
Acho que não. Só se for talvez a questão de poder ter começado mais cedo a gravar as músicas em estúdio. A maioria das músicas dos meus três trabalhos de originais foram feitas em 2006/2007. Só em 2012 é que decidi ir para estúdio. Mas isso teve a ver com um processo natural, diria eu, de decisões de rumos de vida a tomar em cada etapa da nossa caminhada. Decisões essas que nem sempre são lineares, fáceis e claras de tomar. Fiz o que fiz, está feito. Não há volta a dar. Não se pode voltar atrás. Há que lidar com as consequências das nossas próprias escolhas. Isto não quer dizer que eu esteja arrependido. Sou apenas eu a analisar o meu passado à luz do presente. E olha que nem chamaria isto de carreira. Sou apenas eu a mostrar canções que faço de vez em quando…
9 – Que influência teve Adriana Calcanhoto neste trabalho? Conta-nos um pouco da experiência com uma das maiores divas da composição brasileira.
Concretamente, a primeira música deste álbum novo foi feita no âmbito do curso “Como escrever canções”, na Universidade de Coimbra, com a Adriana Calcanhotto. A querida professora Adriana pediu-nos para apresentarmos um tema na última aula do curso e foi exactamente a “Hoje vou fazer uma canção” que eu lá apresentei. Foi uma alegria imensa poder “beber” um pouco da forma como a Adriana vive a música. Foi sem dúvida uma inspiração para o meu próprio percurso. Estarei sempre agradecido a ela pela forma aberta, carinhosa e próxima com que lidou comigo e com os meus colegas de curso. A dinâmica que ela conseguiu criar na turma foi espectacular, principalmente pela postura dela: de partilha de experiências mais do que ensinar de forma rígida fosse o que fosse. Até porque não há – que eu saiba – fórmulas mágicas…
10 – Depois de “Estou no top!” uma viagem com os ouvintes atentos de avião, mas confessaste ter medo de voar. É uma tentativa de libertar dos fantasmas?
É um facto que tenho um medo tremendo de voar. Sim, talvez tenha feito esta canção – a “Piloto de Avião” – com a esperança de que me impulsionasse para outros “voos”… Mas isto comigo tem sido assim: o medo de voar – literal e metaforicamente – está a ser largado aos poucos… Por acaso a letra da música começa com dois sítios onde já estive e depois vai por aí fora num roteiro magnífico que ainda posso vir a fazer…
11 – Para quem esteve no concerto, a letra “A minha espera acabou” foi das letras que mais me ficou na memória. Queres contar como foi o processo deste tema? Nasceu de rompante ou passou por um processo de construção demorado?
Essa música, a “A minha espera acabou”, surgiu como resposta a mim mesmo… O primeiro álbum chama-se “À espera…” e há uma canção que se chama assim, e eu achei, a certa altura, que estava na hora de parar de esperar e de ir…por aí…em busca… Então fiz essa letra para falar desse ir, desse buscar incessante, do partir em busca do que se quer. É curioso porque a dicotomia esperar/não esperar está presente em outra canção minha – a “Terra de ninguém” – onde eu canto: “Onde está o encanto, do que sonhamos ser/ às vezes não sei, se hei-de esperar ou correr”. Ou seja, há momentos de indefinição, por vezes, da melhor postura a ter, se a de esperar ou de simplesmente ir. Talvez haja um tempo para tudo. Em relação ao processo de construção, essa foi feita de uma só vez e rapidamente (como a maioria das minhas músicas). Há canções cuja letra vou fazendo mais lentamente, depois de um esboço inicial na minha mente, mas essa “apareceu-me” já completa.
12 – Na música, consideras que há um lugar só para ti? Qual é a tua “praia”? Em que registo te sentes mais confortável?
Quer na música quer seja no que for, acho que há um lugar só para mim e para toda a gente. É uma questão de irmos paulatinamente construindo esse lugar através do caminho que percorremos. A minha “praia” é ir-me descobrindo. Sem grandes balizas de definição e rótulos, ir fazendo na música o percurso que fizer mais sentido a cada altura. Quer seja tocando sozinho ou acompanhado, com mais um músico ou com banda completa, quer seja country, rock, pop ou folk…o mais importante para mim é que as músicas que componho não percam, quer em estúdio quer ao vivo, a essência que eu quis para elas no momento da criação…
13 – O tema “Follow The Stars” nasceu há muitos anos e terminaste recentemente. Consideras mais fácil passar uma mensagem em inglês ou em português?
Sim, essa música, a “Follow the Star”, foi feita a partir do século passado. Digo “a partir” porque parte dela (a melodia completa e metade da letra) foi feita na minha adolescência – para aí em 1997 ou 1998 – e terminada depois já recentemente, tendo em vista a inclusão dela neste álbum. Foi uma parceria entre o meu “eu” adolescente e o meu “eu” mais atual. Quanto à facilidade de passar a mensagem em inglês ou português, direi que para mim o grau de dificuldade (ou facilidade) existe em qualquer língua. Considero-me, atualmente, um cantautor que compõe músicas em português e que apenas ocasionalmente consegue expressar-se melhor utilizando o inglês. Apenas isso…
14 – “Hoje vou fazer uma canção… uma que começa com um refrão…” que disse a Adriana sobre este tema?
Pelo menos ela a mim disse-me (e a turma também) que gostou… E eu quero acreditar que isso é verdade (ehehehehe)… A reacção na sala, na altura, foi positiva. Essa é uma canção que fala do próprio processo de criação. “Hoje vou fazer uma canção” pareceu-me um bom mote para uma música feita no âmbito do curso que fiz com a Adriana. Mas acho que ela ainda não ouviu a versão em álbum, gravada em estúdio. Mas vou, no princípio de 2020, entregar-lhe um exemplar do CD. Depois saberei se ela gostou do que fizemos da canção…
15 – Quem esperas que “fique aqui para sempre…” ?
Eu, por exemplo. Não me importava de ficar aqui para sempre. Mas sendo isso impossível, quero que fique toda a gente (incluindo eu) o mais tempo possível nesta bola a que chamamos de planeta Terra e nesta caminhada a que chamamos Vida. Essa frase é da canção “Vem, amigo, vem”. Ela começa com “Eu vou ficar aqui para sempre/ Muito embora agora me lembro tenho de ir”. Que é uma constante da vida: ora ficamos, ora vamos, ora esperamos, ora partimos. Sempre, desejavelmente, tendo em vista alcançarmos o melhor para nós. E o que é “melhor” difere de pessoa para pessoa, filosofo eu, o que torna tudo isto mais diversificado e interessante.
16 – O ritmo dos blues surgiu no tema “Vem, amigo vem!”. Que influências da área não dispensas?
É curioso porque tocámos essa música de maneira diferente da maneira que ensaiámos. Tudo porque me apeteceu trocar as voltas ao David Eusébio e começar a tocar a música de uma forma mais lenta. Só a partir da metade é que fui para o registo que está no álbum. Pareceu-te blues? É suposto, talvez, digo eu que percebo pouco disto, entrar numa de bluegrass… Mas olha, nos blues propriamente dito acho que nem tenho grandes referências ou influências. Mas acho que é toda a gente, porque toda a gente vai beber ao blues, quer seja na sua forma mais pura quer seja transformando-o em outros géneros que dele nasceram… Não sou, contudo, a melhor pessoa para falar dos géneros musicais. Não tenho conhecimento suficiente para dissertar sobre isso. Quando me perguntam que tipo de música faço, eu respondo simplesmente que é música ou então respondo mais rebuscadamente que é country/pop/rock/folk…
17 – Achas essencial guardar histórias na memória?
Sem dúvida que sim. Aliás, é com elas que vamos sobrevivendo e vivendo. É a nossa própria história que trazemos sempre connosco que nos permite enfrentar o presente. A nossa narrativa de nós mesmos é o que nos faz reinventarmo-nos a cada instante. E conforme diz a minha canção “Tenho uma história”, é com ela que passo todo o deserto e faço o caminho certo, mesmo que por vezes esse caminho seja o da fuga. Embora, opino eu, a fuga, quando ocorre, deve ser sempre para nos distanciarmos do que não nos faz tão bem… Ou, pela positiva, para buscarmos o que entendemos ser melhor para nós…
18 – O dueto com a Denise Machado “Pedaço de céu” apresentada apenas com uma guitarra levou-me ao “Carta” dos Toranja. A beleza da música enquanto produto está na sua simplicidade?
O dueto com a Denise, no álbum, tem mais instrumentos. Mas no concerto sim, toquei-a sozinho porque foi daquelas que não estavam no alinhamento e apeteceu-me cantar naquela altura. As minhas músicas nascem da simplicidade. Pelo menos eu vejo-as assim, porque elas surgem – letra e melodia – de um simples expressar-me através de canções. Mas é fugidio tentarmos definir o que é simplicidade, porque isso também pode variar de interpretação para interpretação, consoante o ouvinte fruidor da obra. Se simplicidade é ter apenas um instrumento a acompanhar a voz, a “Terra de ninguém” é a mais simples das músicas deste meu álbum. Ou então a “O meu mundo és tu” que só tem um piano e as vozes. Mas lá está, em termos de letra elas até podem ser mais complexas do que outras… Acho que nisso cada pessoa receberá o que ouve de diferente maneira, consoante a sua personalidade, gosto e até momento de vida pelo qual está a passar…
19 – Um dos desafios lançados pela Adriana Calcanhoto foi sobre escrever sobre um amor não correspondido. São uma “mais valia” vivê-los para escrever letras do estilo Lupicínio Rodrigues? Por exemplo ele tem um tema que começa assim: “Felicidade, foi embora…”
Na primeira aula que fui no curso com a Adriana ela falou-me desse desafio de escrever uma canção tendo como tema o amor não correspondido. O que aconteceu foi que, apesar do exercício ser um trabalho de grupo, nesse mesmo dia da minha primeira aula, à noite, em casa, não me consegui conter e esperar pelo encontro com os meus colegas de grupo e fiz uma canção tendo como base esse tema. É claro que depois fiz outra juntamente com os colegas de grupo para apresentar à Adriana, mas o que é certo é que “ganhei” ali mais uma canção para mim. Essa canção chama-se “Porque é que não vais à bola comigo?” e não foi gravada em estúdio neste álbum. Mas é uma hipótese séria para o futuro caso eu grave um quarto trabalho. O cenário é o liceu e fala desse amor não correspondido. É claro que é uma letra que tem dados ficcionados, mas sim, é baseado também em factos verídicos. O amor não correspondido anda por aí à solta…e às vezes apanha-nos… Deve ser o cupido que só consegue acertar com a flecha numa pessoa e não nas duas…
20 – “O meu mundo és tu” foi apresentado naquela noite fria de Novembro no António Lamoso. Teres amigos talentosos a trabalhar contigo é um bem precioso. Que qualidades não dispensas numa pessoa?
Acho que nesse aspecto queremos todos o mesmo. A entrega com boa-fé nas interacções que vamos tendo. Isto no geral, na vida como um todo. Na música em particular, penso que é o mesmo, talvez. Desde que haja entrega com boa-fé, as coisas vão se fazendo e as amizades vão se consolidando, felizmente. Sem pressas, sem pressões tirando as obrigatórias e com espírito positivo. Esta foi provavelmente a pergunta mais difícil de responder, Francisco… E para a próxima tens que me perguntar também quais são os defeitos que não dispenso numa pessoa…eheheheheh…
21 – Terminaste a noite com a música do “Amigo”. A quem dedicaste em silêncio tais palavras?
A todos os amigos, efectivamente. Utilizando frases e ideias da letra dessa canção, citando-me e parafraseando-me, diria mesmo que: o amanhã vai nos trazer novos amigos por fazer, mas os de outrora nunca vão embora, a nossa história há-de se ouvir, de persistir, resistir…nunca vai cair… A música “Amigo”, que também é uma séria possibilidade para um futuro álbum (se ele vier), fala disso mesmo. Dos novos amigos que se vão fazendo – e cada ser humano é um potencial amigo -, sem nunca esquecermos daqueles com quem construímos uma história em comum. Porque são essas histórias, que guardamos nas memórias, que nos fazem permanecer sãos – por um simples recordar – em tempos turbulentos, cinzentos e menos certos…
Entrevista: Francisco Azevedo
Imagem: CineTeatro António Lamoso
Depois de uma época que não se decidiu mais cor-de-rosa para o Tigre (vertente sénior feminino) a equipa atualmente liderada por Tiago Rachão quer fazer de tudo para que não aconteça o mesmo e no calendário conta já com nove vitórias consecutivas, uma delas para a Taça de Portugal diante de um também adversário complicado – Madalena – a equipa está cada vez mais unida e a garra tem-se demonstrado dentro e fora do campo. Em fim-de-semana com jornada dupla (em casa) as Tigres receberam no domingo no pavilhão nº 2 da Nave Polivalente a Associação Académica de São Mamede.
A única bancada disponível naquele sector do pavilhão foi pequena para tantos adeptos fiéis dos dois emblemas, entre familiares e amigos das atletas e treinadores, o jogo teve pelas 17 horas o seu começo. A equipa de Tiago Rachão nem teve razões para sorrir no primeiro Set, a equipa que viajou do concelho de Matosinhos levou a melhor numa primeira parte muito equilibrada levando o jogo para as vantagens que durou até aos 28 – 30. O segundo Set caiu para o lado do Tigre, mas também com equilíbrio até ao final, com uma inscrição de 25 – 23. A temperatura voltou a subir e as pupilas de Tiago embalaram para um esclarecedor 25 – 12.
O terceiro set (que viria a ser decisivo) nas contas finais caiu uma vez mais para a equipa da casa, com um jogo ao nível ofensivo e do bloco consistente e uma diferença de sete pontos. No sábado a equipa recebeu na Arena Tigre o C.S. Madeira e foi uma cópia do que se passou na tarde chuvosa de domingo, tendo perdido o primeiro Set com uma diferença de doze pontos, recuperando depois no segundo com uma vantagem de oito. A equipa que viajou do arquipélago ainda deu o ar da sua graça no terceiro Set obrigando o Sporting Clube de Espinho a aplicar-se na parte final para fechar a seu favor com 25 – 22. O quarto Set as contas foram ligeiramente diferentes, tendo a equipa local conseguido fechar o encontro com um 25 – 19.
Porto, 11 de Novembro de 2019
Cheguei cedo. Depois de entrar na cidade pela ponte que me mostra o anfiteatro da Ribeira e o ferro da D. Luiz I consegui (se calhar um sinal…) serpentear pelas ruas da Baixa sem ficar retido num semáforo. Tive luz verde para ir ao encontro de Ana Paula Cruz (Lokas Cruz, como gosta de ser tratada) na Pastoral Universitária, residência que acolhe estudantes de 70 nacionalidades diferentes, um local perfeito para aprender a ver a vida com outros olhos, a sermos mais tolerantes. O mote foi dado pelo Padre José Pedro Azevedo e pelo Dr. José Veiga – Responsável da Pastoral Universitária.
Ana Paula foi convidada no âmbito do “Três meias e dás à sola” em que inclui sempre uma celebração na capela – no primeiro piso – uma conversa e um jantar partilhado. A primeira vez que ouvi a voz jovial, doce e terna de Lokas, confesso não tinha os olhos no monitor do Porto Canal (entrevista dada a Júlio Magalhães a 26 de Julho deste ano), poucos dias antes de embarcar numa das mais intensas missões: a de busca e salvamento no Mar Mediterrâneo – mas já lá vamos! Com a vontade de vos contar tudo o que me deixou (e a todos em silêncio durante uma hora e tal) esqueci-me de a apresentar.
Ana Paula Cruz nasceu em Celorico de Basto, estudou Medicina no Instituto de Ciências Biomédicas de Abel Salazar e fez a sua primeira experiência no terreno – depois de um ano de formação – ao abrigo do projecto “Grão” e aí percebeu que tinha uma missão “… Era do mundo e que – a casa vai ser longe do sítio onde nasci…”. Para Fonte Boa (região de Moçambique) levava apenas numa mochila três pares de calças, quatro t-shirts e dois pares de botas. Tem – apesar de terna idade – consciência do mundo em que vive e sente necessidade de ir “… onde dói mais…”. Nessa primeira viagem (sem redes sociais) e com uma chamada para a família semanalmente, só se preocupou com uma coisa – o de dar o melhor de si. Vacinou crianças, deu cursos de primeiros socorros nas escolas e ajudava os adolescentes a olhar para o futuro.
Em 2016 encontrava-se a realizar o último ano do curso em Itália (Erasmus) e a estudar para o exame final (Harrison). A título de curiosidade é com a nota que os alunos poderão concorrer à especialidade que mais se identifica consigo. Foi também nesse ano que o mundo assistiu a uma grave crise humanitária e à entrada de refugiados na região de Lesbos (na Grécia) e em Malta. Ana sentiu necessidade de contribuir com as suas mãos, sabedoria e coração num dos contextos mais complexos, passou os dois últimos meses do ano (Natal inclusive) às portas da Grécia que não vem nos postais.
Não esqueceu de contar que mesmo perante as dificuldades (violações às mulheres no campo, às tendas em que viviam que deixavam passar tudo: chuva, vento, até a morte…), havia espaço para a esperança com uma imagem de um menino com um postal a dizer “This Christmas I Wish you good” / “Este natal desejo-te o melhor”. Foi também por esta altura que deu a conhecer o Cemitério dos Coletes, uma zona de uma enorme carga emocional, de um silêncio arrebatador. Ali, Lokas encontrou de tudo: de biberões a sapatos e até o Corão. Na imagem – a que tivemos acesso – aparecem jovens voluntários de costas a olhar o cenário Dantesco. A Lesbos chegaram pessoas de vários países que passavam por graves crises humanitárias tais como o Afeganistão, Congo… O campo não era mais do que muros de rede e arame farpado. Ao ver tudo o que a rodeava – Lokas sentiu vergonha de ser europeia, ao mesmo tempo que tomava consciência de que a inércia é o pior inimigo da Humanidade.
Mesmo existindo pouco espaço para acreditar em “algo bom” as noites eram mágicas para um grupo de crianças e para eles – enquanto humanistas, médicos, enfermeiros, fotojornalistas – cada vez que o sol se punha utilizavam um contentor onde passavam filmes, e era por ali também que muitas das crianças perseguiam os seus sonhos. Dois exemplos que nos deu: da criança que sonhava um dia ser professora de ciências (e conseguiram arranjar-lhe livros para alimentar o seu sonho) ao menino que queria ser break dancer. O que mais queria era naquele “mundo” conseguir trabalhar o perdão e dizer vezes sem conta “… esta também é a tua casa, és bem-vindo!…”.
Em 2017 suspendeu o internato e voou até à região de Dundo – Angola – para um cenário onde encontrou um “histórico” conflito com mais de vinte anos, 40 mil pessoas fugiram do genocídio, das milícias… Nessa missão, Lokas tinha três pontos a fazer:
E SEMPRE… no meio de tudo, Lokas encontrava forma de conceder e proporcionar dignidade na hora da morte. Contou que um dos momentos mais felizes foi quando chegaram ao campo sacos-cadáver e já não precisavam de enterrar pessoas em cobertores. Há lugares no mundo onde já não nascem flores, mas Lokas descobriu e ficou em paz consigo própria. Existe um contraste real entre o que é escuro e difícil com tudo o que é luminoso e bonito, quando chegava ao campo diariamente crianças de sorriso no rosto corriam na sua direcção. Para evitar que aquele número de crianças crescesse em orfanatos uma das tarefas de Ana era dar formação a famílias locais que se predispunham a adoptar sobre saúde e infância – que é de resto o que faz diariamente no Centro do Saúde onde trabalha em Freamunde.
“… Sinto que estou em todas as missões, ainda! É o mundo que nos ensina a cuidar do mundo…”.
Em 2018 rumou ao Bangladesh (comunidade de um milhão e duzentas pessoas). O que é assustador é trabalhar num dos maiores campos de refugiados do mundo. Fez uma viagem pelo campo 4 durante horas e só depois lhe explicaram que só tinham visto um, são 27 campos. A violência no campo justifica muita coisa do que depois é visto e analisado nas consultas. Tinham uma média de 300 pessoas na sala de espera por dia. As mulheres continuam a ser um alvo – mesmo dentro do campo – pelo que a maior parte usava fraldas para não ter de ir a meio da noite às latrinas. Para uma família de 4 pessoas tem para um mês um litro de óleo, dois quilos de farinha e feijão. O contexto é muito difícil, não chega a violência que já passaram em Myanmar mas também no campo. Ana considera que não é complicado saber alguns detalhes daquele um milhão e duzentas, é sim em consulta ter uma pessoa e saber o que ela passou. Dói, de forma desproporcional. Tirava fotografias às mãos das mamãs e das crianças por ser mulher e descrevia o que lhe contavam. Recordou a história de uma mãe com aproximadamente 60 anos de idade mas com aspecto muito mais velha que quando os militares chegaram à aldeia e matavam indiscriminadamente, conseguiu fugir e esconder-se durante dois dias num buraco. Utilizava a expressão “Eles matam-nos como quem corta erva…”.
No meio de tudo há histórias bonitas, de reencontros no campo. Os Rohingya pediam para falarem deles ao mundo, o que lhes estava a acontecer. Recusa estar em silêncio, e disse até melhor: o nosso dever enquanto médicos, humanistas, voluntários é DEFENDER e DENUNCIAR.
Já este ano decidiu interromper a actividade profissional durante seis meses, tinha ideias de voltar para os Campos de Refugiados na Europa só que entretanto dá-se o ciclone em Moçambique. Ana tem uma ligação muito especial àquele país e não conseguiu ficar sentada em frente à televisão a ver o que acontecia, e contactou a AMI (Assistência Médica Internacional) sem esperança de que lhe retribuíssem o email, só que menos de vinte e quatro horas depois recebeu uma chamada telefónica dizendo que contavam com ela. Sempre foi uma pessoa descontraída e quando a questionaram sobre quando poderia ir ela disse:
– Amanhã!
O feedback do outro lado foi de aprovação, mas depois disse que precisava de arrumar a mochila. Mais uma vez – Lokas surpreende-nos com esta frase:
“… Uma coisa que era mesmo agradecida era perceber que a minha vida em 48 horas cabia numa mochila de 15 quilos mas o meu coração muito mais pesado, com muito mais inquietações, mas que cabia e queria estar lá, não havia nada que me impedisse de ir para perto deles…”.
Teve a honra de trabalhar com uma equipa incrível no Hospital de campanha, chegaram a Beira dez dias depois do ciclone, e com ele: ferimentos, mortes, destruição de casas, árvores, surto de cólera, malária e todo um impacto das perdas e da morte. Esteve na Beira até Junho, conseguiu testemunhar a força daquelas pessoas em reconstruirem as suas vidas, as suas casas e conta também que um dos locais (Nonô) que trabalhava perguntou se podia sair um bocadinho mais cedo porque tinham chegado as chapas para o telhado.
– Viveste este tempo todo sem telhado? Vai, claro que sim – e deu-lhe um abraço!
Mostrou uma imagem feita no final de Maio onde ainda era visível a destruição, a reconstrução e o sorriso das crianças – que recorda – era o mesmo quando lá chegara. Na consulta uma coisa que a marcou foi que quando perguntavam o que tinham, se estava tudo bem eles diziam que sim, mesmo que tivessem perdido família, a casa. Diziam que estavam bem porque estavam vivos.
“… O número de pessoas que ia precisar de ajuda era imensa. A maneira como eles vivem esta dor em comunidade e como o instinto de sobrevivência não é maior que o instinto de proteção comunitária. Ensina-nos imenso…!”.
Mais recentemente – depois de umas semanas em Portugal – fez parte de uma equipa de busca e salvamento no Mar Mediterrâneo (Julho e Agosto), a missão mais intensa em termos de contexto político a cerca de 24 milhas náuticas da Líbia e era a única médica a bordo. Mais de 1200 pessoas perderam a vida desde o início do ano para tentar chegar à Europa, e desde 2013 mais de 20 mil, é a fronteira que mais mata no mundo e “… morrem à porta de nossa casa, literalmente…”.
Obrigado Lokas pela forma como fizeste de uma sala em silêncio uma viagem na(s) primeira(s) pessoa(s). É de pessoas como tu que o mundo precisa para que o horizonte seja azul e a esperança imortal.
OLHAR COMO QUEM VÊ, E COMO QUEM SENTE!
Texto: Francisco Azevedo
Imagem: Arquivo Digital Ana Paula Cruz / Francisco Azevedo & Pedro Fonseca
A conquista da Taça Libertadores e do Brasileirão ao serviço do Flamengo colocam Jorge Jesus no centro das atenções. A partir de uma análise rigorosa da sua carreira, num livro escrito por Rui Pedro Braz, vamos entender as razões por trás deste sucesso, as metodologias que o tornam tão diferente, os traços de personalidade que fazem do Mister um personagem ímpar no mundo do futebol. Jorge Jesus fará reverter os seus direitos de autor, na versão brasileira do livro, para a ala pediátrica do Instituto Nacional do Cancro daquele país.
A edição portuguesa de «Mister Jesus» chega às livrarias a 13 de dezembro, poucos dias depois de ter sido editado no Brasil o livro com o mesmo título.
Dos confrontos táticos com treinadores como Sir Alex Ferguson, Simeone, Zidane, Ancelotti, Bénitez ou Deschamps, às estratégias para travar jogadores como Cristiano Ronaldo, Messi, Ronaldinho Gaúcho, Iniesta, Ibrahimovic ou Cavani. Os maiores palcos do futebol mundial não têm segredos para Jorge Jesus, mas para lá chegar teve de começar por baixo, nos campos pelados de clubes com modestas condições.
«Mister Jesus» é um livro de futebol, sim, mas é muito mais do que isso. É a história do menino que viu o seu avô falecer ao seu lado no mais longo jogo da história, mas também do jovem que decidiu ser jogador depois de adormecer com a cara num prato de sopa. É a história do futebolista que foi convidado para ser treinador quando ainda jogava, mas também do treinador que teve uma arma apontada à cabeça num treino. Em suma, é Jorge Jesus na sua essência. Um treinador inimitável, oriundo de um futebol que já não existe e dono de um conhecimento muito à frente do seu tempo.
Conhecedor profundo da carreira de Jorge Jesus, Rui Pedro Braz apresenta-nos nesta obra um trabalho de detalhe, baseado numa investigação e análise rigorosas dos 30 anos de carreira do técnico, 52 clássicos disputados em Portugal, 124 duelos internacionais, 1121 jogos como treinador profissional e inúmeras histórias de vida que traçam um perfil brutalmente honesto e nunca antes conhecido. Porque nenhum dos seus sucessos é obra do acaso.
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