O João, se fosse vivo faria hoje dez anos. Talvez não seja pior fazer um delete das primeiras palavras e dizer: o João, hoje comemorou dez anos. Conheci-o num longo percurso pelos corredores do Instituto Português de Oncologia do Porto – IPO – em 2016 mas antes já ouvira falar dele pelo fotógrafo amigo Jorge Castro. Se não fosse o Jorge o João não teria tido a oportunidade de ser modelo. E que olhos ele tinha! Eram azuis, cor de céu e mar. A paixão pela vida era tanta e ajudar estava-lhe no sangue que todos os dias em que entrava naquelas portas envidraçadas exclamava a toda a gente:
– Ora bom dia para si também!
O olhar atento do João perante todos permaneceu intacto até o dia em que partiu, era uma criança que sorria ao invés de chorar. Quando se colocou a hipótese de voltar para casa decidiu por vontade própria voltar para junto dos seus e fazer tudo o que tinha previsto. À sua pediatra assistente que foi incapaz de conter a emoção durante a manhã de hoje no Auditório Azul do IPO do Porto, recordou o momento em que o João lhe disse:
– Um dia vou ser médico e vou ficar no seu lugar.
Conheci o João no corredor da pediatria, bem disposto, sorridente – claro! – e sem máscara. Semanas depois na televisão – TVI – a mãe dizia com esperança no olhar – se Deus quiser, para o ano estaremos livres do IPO. O João faz hoje anos e as madrinhas fizeram questão de vestir camisola branca e recordar os momentos do João, quer no hospital quer em casa. Criou o seu próprio consultório para livrar os seus das doenças e nunca desistiu. As enfermeiras, as educadoras, as auxiliares recordam-no agora em livro brilhantemente escrito pela Rita Soares. De voz embargada disse:
– O João foi um mensageiro. Despediu-se de toda a gente e fez o que quis.
Dos testemunhos mais emotivos foi o desta amiga do João. Recorda-se que um dia passou-lhe pelas mãos um livro entitulado “Nunca tive jeito para chorar” da mesma autora do “Desafio de uma criança com cancro” mas ela – diz – é para o que tem mais jeito. Acompanhou o João e os pais: o pai Herói e a mãe Coragem. Organizar um evento de apresentação do livro no dia de aniversário do João não é para todos e eles conseguiram-no. Foi bonito ver naquela sala médicos, auxiliares, voluntários e no fim todos cantaram os parabéns ao João. No dia em que se despediu de vez do IPO o João reparou que as cadeiras de rodas onde o colocaram eram velhas e pouco confortáveis. Pediu à mãe que escrevessem o seu livro, a sua história, a sua missão de oito anos na terra e com o dinheiro entregassem ao Instituto Português de Oncologia cadeiras novas.
– Viveu mais do que qualquer adulto com cem anos… Bem, cem anos estou a exagerar – disse uma das madrinhas.
O Instituto Português de Oncologia fez-se representar por um membro do Conselho de Administração, Dr. Ilídio. Falou sobre a instituição e como doentes como o João Pedro são um exemplo de coragem, assim como os pais que continuam a ter uma ligação próximo ao IPO.
A outra madrinha do João Pedro – nascido em Pedroso – Vila Nova de Gaia – optou por ler uma passagem do livro.
A pediatra assistente (orgulhosamente até ao fim) como diz no livro recordou o doente que teve pela frente, o caso era dos mais graves (abdomiossarcoma nas paredes do abdómen). “…O João tinha a elevada missão de nos fazer reflectir e sensibilizar para causas que vão para além das fronteiras que nos impomos. Estará, agora, nas nossas mãos, dar seguimento à missão do João Pedro…”.
Na imagem a médica – Ana Maia Ferreira que acompanhou todo o caso do João Pedro. Recorda uma criança corajosa, sorridente.
Os pais do João: Pedro a Ana – ou como os tratam – o pai herói e a mãe coragem fizeram questão de recordar o filho, aproveitando para ler uma passagem do livro. Um dos momentos mais marcantes da apresentação. Felizes os que o tiveram por perto. Ficará na memória eternizado em livro, cento e quarenta páginas de episódios que prometem não deixar ninguém indiferente. A nós… não deixou!
O pormenor na cadeira da frase que o João sempre dizia quando passava as portas envidraçadas do edifício do IPO.
O João com cabelo e com o sorriso que o caracteriza na inauguração da exposição Fashion Kids do fotógrafo Jorge Castro; Fevereiro de 2017
Um Abraço , João!
Tantas foram as vezes que atravessou a ponte só para lhe dizer um olá. Naquele dia passou para dizer adeus. Prometeu a si próprio não voltar àquela loja, lembrava-se de tudo (o que tinha deixado) para trás.
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