“O sal, das minhas lágrimas de amor
Criou um mar que existe entre nós dois
Para nos unir e separar…”
Na preparação da nossa viagem, quem fez companhia é uma dupla “improvável” – um fado de Vinícius de Moraes e a voz quente de Carminho. Podemos vir até falar de amor, sobre paisagens, mas será sempre por Portugal, pelo Brasil, pelo céu azul do Algarve e os socalcos do Douro.
Caliandra Belniowski é uma referência na arte de saborear o vinho (wine influencer do ano), uma diva no prazer de incendiar um charuto na companhia da lua e, uma musa que inspiraria (estamos certos!) o mais puro dos poetas. Não é difícil imaginar Jobim / Vinícius ou Fernando Pessoa a desenharem os seus traços em palavras. A primeira vez que vi Caliandra foi numa reportagem da SIC na lonjura alentejana com mais um punhado de entusiastas do prazer de Baco.
A sua história especial com Portugal tem os tons da capital, mas não consegue desligar-se de forma alguma dos socalcos do Douro e da cidade do Porto – onde espera um dia viver.
FA – Caliandra, obrigado por esta conversa entre dois continentes. Para quebrar este “gelo” e a distância social, que vinho escolherias para um início de conversa?
CB – Bom meu caro, eu que agradeço o convite e para que você brinde comigo num momento mágico, como esta maravilhosa conversa será, escolho o Scala Coeli, um monocasta de Alicante Bouschet da Adega Cartuxa, um vinho que o nome já diz para o que veio,”Escada para o céu”, nos levando para outra dimensão, um vinho singular dessa uva da qual sou fã e que representa muito bem Portugal e a mim! Uma uva tintureira, marcante, impossível passar desarpercebida por ela, intensa e surpreendente na cor, nos aromas e no paladar!
FA – Se tivesses vivido no tempo da Grécia Antiga, que conselho darias a Baco quando ele criou o vinho?
CB – Ahh as vezes me ponho a pensar em tais épocas, me fascinam, acho que falaria beba com moderação haha!
FA – O vinho é uma arte, que tem o seu custo e o trabalho. O respeito pela matéria, pelas pessoas que o trabalham e dão vida, ficou ainda mais elevado quando conheceste o terreno?
CB – Ahh com toda certeza, quando você conhece as pessoas da região, aquelas que colocam a sua mão na massa que vivem daquilo, você mesmo quando não gosta de um vinho, consegue perceber mesmo assim o valor e a importância que ele tem.
FA – Com esta vontade de falar de vinhos e de conhecer um pouco mais de um ser que emana luz, esqueci-me de perguntar se podia tratar por tu 🙂 desculpa! Um copo, é uma via para os sorrisos e um serão bem passado?
CB – És um querido, pode me tratar por tu, claro! Sem dúvida, eu costumo dizer que o vinho é uma bebida mágica ( quando na medida certa), capaz de derreter os corações gelados e fazem a mascara do medo, da timidez e da insegurança caírem ao chão, revelando sorrisos mais inebriantes, por isso também é considerada uma bebida romântica.
FA – Como foi o primeiro contacto com o vinho? Agradável ou nem por isso?
CB – Não foi amor a primeira vista! Eu não consumia nenhum tipo de bebida alcoolica e o meu paladar não estava acostumado para os primeiros vinhos que degustei, me lembro até que alguns achei desagradável. Mas sabia que existia ali algo que me atraia, então insisti até que em um vinho verde, encontrei a minha porta de entrada para o mundo do vinho e agora estou cá.
FA – O mundo tem lugares com características únicas para a cultura vínica. Que regiões do mundo conheces (além do Douro e Alentejo)?
CB – Já visitei Mendoza na Argentina e o Vale dos Vinhedos em Bento Gonçalves no Rio Grande do Sul – Brasil, mas ainda há muito por conhecer e desvendar neste mundo vinico.
FA – Alguma delas se assemelha aos socalcos e ao rio especial que atravessa a cidade do Porto e Gaia?
CB – Para quem aprecia vinho, cada região é mágica, revela segredos em suas taças deste mundo que é incessantemente surpreendente! Para os apaixonados pelo vinho, costumo dizer que funciona igual a um casamento, diferente daquele flerte ou relacionamento despretencioso, com quem saimos algumas vezes, quando dá vontade a gente vê, mas nos mantemos sempre na superficialidade! No casamento, vamos a fundo, conhecemos a história, a família de onde vieram, as características, os defeitos… e assim seguimos tentando desvendar e conhecer todos os processos e entendemos que uma má experiencia, faz parte do aprendizado e não é isso que nos leva ao divórcio (risos!). Então posso dizer que as ainda poucas regiões que conheço, são únicas por natureza, todas me marcaram de um jeito especial e pretendo revisitar todas com mais tempo. O Douro ahhh o Douro, é impossível não se emocionar, tem o poder de nos fazer viajar no tempo e sentir a coragem que tiveram os trabalhadores que plantaram cada vinha, revivemos as suas dificuldades. Olhamos o rio e imaginamos aquelas embarcações antigas que desciam o Douro transportando os barris cheios de vinho. Estar ali é para os que casaram com o vinho uma lua de mel e para os que flertam, com certeza ali começam a considerar um relacionamento mais profunto e duraDouro como o Douro!
FA – A minha avó, que viveu até aos noventa e nove não tinha o hábito do vinho, mas não dispensava nas datas especiais um vinho do Porto. Que características te vem à memória que fazem dele um dos mais antigos do mundo?
CB – A característica principal você mesmo a descreveu, a tradição! Nem mesmo a sua sábia avó não dispensava a bebida nas comemorações, é o peso cultural que existe em algumas regiões, sobretudo do velho mundo. Depois, a influência dos grandes produtores e exportadores de vinho do Porto, que fizeram do Douro a primeira região com denominação de origem!
FA – A primeira fotografia que vi tua, foi na Quinta do Crasto (sou fã incondicional de néctares de 2015, especialmente tintos). Um fim de tarde naquela varanda e um “Vinha da Ponte” ou um “Vinha Maria Teresa” que sabor tem?
CB – Difícil fazer uma descrição que faça juz ao momento que apreciei ali, mas farei uma comparação para que os leitores tenham um noção e que ao mesmo tempo os deixe com vontade de ter a mesma experiência! Aos que apreciam vinho, sabem que na enogastronomia, numa harmonização perfeita, o sabor do vinho em comunhão com o sabor do alimento, criam o que chamamos de terceiro sabor, eles se complementam de maneira que um eleva a qualidade e o sabor do outro! Acho que a maneira mais simples de explicar o que senti ali! Um vinho da Quinta do Crasto harmonizado com aquela vista, criaram para mim o terceiro sabor. Individualmente, degustar o vinho ou apreciar aquela atmosfera já teria sido um prazer , mas os dois juntos me deixaram fazer parte de uma obra de arte, eternizada no tempo e guardada no meu coração!
FA – O que para ti funciona melhor numa tábua de queijos?
CB – A fome e a vontade de comer (risos!), brincadeira! Bom o vinho eu defino, na grande maioria das vezes pelo meu humor e sou daquelas pessoas que primeiro escolhe o vinho e depois decide o que irá comer, é claro que isso as vezes pode não dar certo, mas é que para mim a melhor parte da refeição é a que se bebe. Numa tábua de queijos, há sempre muitas variedades e intensidades de queijo, sendo que cada um seria apropriado um vinho especifico, nestes casos é aconselhado o gosto pessoal de cada um. Como um coringa acho os espumantes uma boa opção e os tintos leves de acidez mais elevada, para ajudar na limpeza do paladar.
FA – Combinação de castas ou monocasta? Experimentei recentemente uma casta Syrah do Alentejo e também (já fora desta quarentena) um Touriga Nacional da Quinta do Vallado.
CB – Eu aprecio muito monocastas como forma de aprender, de poder ver as particularidades de uma variedade em especifico, mas os vinhos de corte têm meu respeito e admiração, acho simplesmente lindo o trabalho enológico quase mágico, de fazer com que as castas se complementem na medida certa, uma integrando nos entregando muito mais.
FA – Em Abril (17) partilhaste no teu Instagram @brinda_comigo um conjunto de imagens em Catena Zapata. Que diferenças ao primeiro trago encontras num vinho argentino e um português?
CB – Bom, uma das principais diferenças seria a variedade de castas que encontramos na grande maioria dos vinhos portugueses que muitas vezes nem mencionadas são, enquanto na Argentina a uva emblemática e que é responsavel pela maioria dos rótulos produzidos por lá, é a Malbec. Depois as diferenças olfativas e gustativas podem variar muito pelo terroir de suas sub-regiões, mas com toda a certeza de que os dois países produzem com muita qualidade.
FA – Um bocadinho antes, em Março uma fotografia carregada de glamour e um texto que dizias “… o fato é que demoramos imenso tempo para poder escolher nossas roupas, nossas profissões e até como deveríamos comportar… ainda muito trabalho pela frente para educar a sociedade a respeitar a nossa liberdade, já podemos realizar grandes feitos e em relação ao vinho a nossa presença é cada dia mais notada…”. Que principais entraves encontraste no início da tua actividade profissional? É aí que entra a tua história com Portugal?
CB – Iniciei no mundo do vinho trabalhando em restaurantes portugueses, ali tive o primeiro contato com o serviço de vinho, mas não me aprofundei no conhecimento, só sabia que gostava, e muito! Quando regressei ao Brasil, percebi que poderia ser um mercado profissional muito promissor. Só que além de não termos a cultura voltada ao vinho, qualquer curso na area é muito caro, então tive que adiar durante muito tempo a minha profissionalização. Pois bem, quando enfim iniciei o curso de sommelier profissional e em simultaneo quis compartilhar o meu aprendizado nas redes sociais, na minha página @brinda_comigo, percebi que nem tudo seriam flores, e fui obrigada a lidar com duras criticas, sobre o meu jeito de falar de vinho, e porque não me levavam a sério. Então deduzi que teria que me assumir sim como “blogueirinha”, “wineinfluencer”, “sommeliere” e continuar com o meu trabalho seguindo a minha intuição. O importante para mim, são as pessoas que me seguem, que querem aprender sobre vinho, que estão começando a se descobrir neste mundo, interagem comigo, compartilham suas experiencias a partir do que viram nas minhas paginas e me dão um feedback super positivo, elas acreditam em mim e isso me motiva! Essa história me levou a Portugal novamente este ano, como finalista do concurso Melhor Sommelier do Alentejo, outra grande coroação da minha ainda curta trajetória no mundo do vinho.
FA – O Prémio Brindô 2019, foi um “arranque” para um percurso que pretendes levar até quando?
CB – Não foi um arranque, vejo como uma coroação de um trabalho que vem sendo feito com muito amor, muita dedicação e muito carinho. Quando comecei a única intenção era difundir a cultura do vinho no Brasil, não fazia ideia até onde poderia me levar, este prémio só veio mostrar que estou no caminho certo, fazendo o que sempre me propus a fazer! Até quando?! Não sei dizer, enquanto ainda houver vinho e o prazer em degusta-lo, talvez!
FA – Realizar uma sabragem é voltar ao tempo dos super heróis?
CB – Olha não sei se descreveria assim, mas é realmente uma sensação muito boa, posso dizer que me sinto como Napoleão Bonaparte ao comemorar uma vitória.
FA – Em Agosto, no dia 29 (também no Instagram) referes o trabalho de um Sommelier (ou escansão em Portugal) não ser valorizado e há inúmeras coisas que passam despercebidas… Em algum momento pensaste desistir?
CB – Não é um assunto confortável de se falar, pois acredito que nunca devemos desistir dos nossos sonhos e eu prefiro inspirar as pessoas a fazer o mesmo, mas sim já pensei em desistir muitas vezes. Sou mulher, jovem, mãe, falando de vinho em redes sociais, tem gente que acha lindo e poderoso, mas tem muitas pessoas que se incomodam com isso e fazem questão de tentar atrapalhar a sua caminhada, ou ainda, se dispõem a falar comentários ofensivos ou a tirar conclusões precipitadas a seu respeito sem ao menos te conhecer! O importante é que em todos os momentos que tinha estes pensamentos Deus me mostrou que não era este o caminho e me apresentou novas possibilidades, assim tenho me mantido de pé. Resiliência!
FA – Agora um exercício de criatividade… Um wine festival é um lugar ideal para…
CB – Celebrar a vida e o vinho, compartilhando muitos brindes!
FA – Os diálogos etílicos são…
CB – Às vezes profundos, às vezes divertidos, por vezes ainda melancólicos mas sempre verdadeiros… Afinal In Vino Veritas.
FA – Quem são as tuas referências no mercado do vinho no Brasil?
CB – Bom há vários nomes, o Gustavo Giacchero, Debora Breginski, Guilherme Balbino, André Ferreira, alguns não muito conhecidos mas que amam o que fazem e trabalham muito sério!
FA – Que sentimentos associas ao som do vinho a cair no copo?
CB – Posso comparar com o som do mar, ele nos tranquiliza e nos dá a sensação de fazer parte de algo maior.
FA – Um outro momento carregado de simbolismo e serenidade acompanha uma frase “A mulher é como a uva. Tantas partes a compõe. Ela não é uma. Ela é um todo!”. Que adjectivos escolherias para um perfil?
CB – De uva ou de uma mulher? (Risos!) Não sei se entendi bem, mas vamos a isso! De pele grossa e de cor reluzente, anunciando a potência dos taninos que precisarão serem apaziguados passando um tempo pelo carvalho. Madura no ponto certo, com o açúcar nas alturas prestes a fermentar e transformar essa potencia em álcool este que por sua vez vai integrar o sumo e fazer com que os elementos se unam em comunhão, sendo seco e elegante, os taninos aveludados e macios com eram em pele, a acidez se faz presente e necessária, provocando a salivação e em cada gole, a boca se preenche e espera por mais, ela é um vinho que não mata a sede, mas vicia!
FA – O “Da Magia a Sedução” Vinho e Erotismo é um evento secreto para mulheres. Podes partilhar um pouco dessa experiência?
CB – Claro, nasceu de uma ideia minha em proporcionar as mulheres um momento leve, descontraído mas que ao mesmo tempo elas possam aprender sobre vinho e sobre experiências, umas das outras! O evento sempre há uma surpresa, para provocar a mulher, para ela se sentir confiante e conhecer a sua própria força. Claro que o vinho faz o trabalho mais dificil, que é quebrar o gelo das participantes e fazerem elas irem aos poucos entrando no clima da brincadeira e interagindo. O erotismo passa pelo sexo e também falamos e debatemos sobre isso, mas antes disso ele passa pela auto – confiança, pela sedução de cada mulher e é este ponto que gostamos de trabalhar, afinal não existe mulher mais sensual que uma que é segura de si, mesmo conhecendo seus defeitos. No fim cada uma sai descobrindo algo sobre si mesma que nem imaginavam. O vinho na medida certa é libertador!
FA – “Ela é tão livre que um dia será presa…”. Como tem sido esta quarentena?
CB – Bom não é fácil, principalmente para alguém hiperativa como eu, sempre cheia de projetos, acostumada a correria. Estamos a ser forçados a parar e olhar para o nosso interior e também a pensar no próximo, nas classes mais prejudicadas que estão sendo afetadas não só pelo COVID19, mas também pela fome e tudo que esta vindo por causa da pandemia! Que seja uma lição aprendida e jamais esquecida! Eu tive imensos projetos parados, tive contrato de trabalho suspenso, mas tenho conseguido aproveitar muito mais minha filha, tenho lido mais, estudado assuntos novos e voltei a praticar yoga e meditação! Em todas as adversidades precisamos procurar pelas oportunidades, é o olhar a metade do copo cheio, ou a metade do copo vazio, acaba sendo uma decisão de cada um.
FA – Agora não tem a ver com vinhos, mas sim com saudades. Que sentimentos te invadem numa fotografia de um café e um pastel de Belém?
CB – Affff, muita nostalgia! Vivi em Potugal a minha junventude, a época sonhadora, em que acreditamos em tudo e em todos, movidos pela paixão normal da idade. Foram muitos aprendizados, muitos amores e muitos momentos inesquecíveis entre um café, um pastel de belém e taças de vinho.
FA – O Porto é um amor que não se explica?
CB – Certamente sim! Sabe tenho muitos amigos portugueses que me dizem até hoje que se eu tivesse morado no Porto eu não teria voltado para o Brasil (Risos!) pode ser mesmo que sim, mas era o destino, quem sabe ainda aconteça muitos reencontros nesta cidade!
FA – Agora vamos incendiar um charuto J Sigmund Freud diz “Smoking is indispensable if one has nothing to kiss” e são das imagens mais bonitas que se podem fazer, a nuvem e o imaginar do aroma numa mulher e um olhar sedutor. Já algum seguidor te pediu em casamento?
CB – Hahaha affff , já sim, mas certamente era brincadeira! Uma mulher com uma taça de vinho e um charuto na mão causa sérios danos na cabeça de um homem, eles podem até se sentir atraídos e curiosos, mas pasme, eles têm medo! Uma mulher que é capaz de fazer o que lhe dá prazer e não se importa com a opnião do mundo não é uma mulher para “casar” para a maioria dos homens. Homem quer segurança, quer quer as pessoas olhem e pensem da sua mulher como é linda, bem educada, bem formada, sabe se portar, uma lady . Não querem um vulcão que pode entrar em erupção a qualquer momento, isso é demasiado para a maioria deles.
FA – Um gesto que leva “os cabelos em pé” de um apreciador é ver um “amador” sacudir a cinza. Verdade ou mito que se deve deixar a cinza seguir o seu “rumo”?
CB – Verdade (risos!) até certo ponto, a não ser as pessoas que participam de concurso de cinzas que estão focadas em mante-las, mas que acaba tirando o prazer do momento de apreciar o charuto, para mim no caso, a cinza deve estar lá até que ela mesma decida partir, quando percebemos este momento podemos ajuda-la fazendo um movimento delicado ( e não batendo o charuto e nem sacudindo!) para que ela se liberte! Acontece que as vezes a companhia é tão boa que quando nos damos conta a cinza já partiu, caindo sobre a nossa roupa ou pelo chão rsrs faz parte!
FA – O Espaço Baltoro – que foi palco de encontro com DiogenesPuentes tem umas prateleiras convidativas 🙂 os charutos são um convite a um esquecer das horas?
CB – Sim, a primeira regra do charuto é não ter pressa! Aquele momento é seu, para mim funciona como uma terapia, um momento de reflexão se estou sozinha e um momento de interação produtiva, quando acompanhada. Uma maneira de dar valor ao tempo, o charuto de proporciona esta janela para o nosso interior, falo por mim claro!
FA – Podemos encarnar no espírito de Romeu & Julieta quando o saboreamos com uma pessoa especial?
CB – Ahh não vá por aí amigo que esta história acabou mal (risos!), mas sim tem outro valor se saboreado com uma pessoa especial, acho que podemos recriar a nossa própria versão de Romeu & Julieta!
FA – O “Montecristo” continua a ser um dos charutos mais apreciados no mercado? Que características não dispensas num cubano?
CB – Sim, o Montecristo é umas das grandes referencias de charutos cubanos, não sei te reponder com exatidão às questões mercadológicas, mas segue sendo um dos principais sem dúvida pela qualidade e tradição. Agora falando das características, não só no tabaco cubano mas os de todas as procedências inclusive do Brasil, que produz charutos maravilhosos, o que procuro sobretudo é sabor e aroma, a potência é relativa pois para mim depende do momento que irei degustar e de qual será a harmonização para determinar o quão potente ele deve ser.
FA – Ir a Cuba e não fumar um Cohiba é o mesmo que ir a Roma e não ver o Papa?
CB – Olha eu não me atreveria a visitar Roma e não ver o papa e ir a Cuba e não fumar um Cohiba, é igual a ir ao Porto e não beber nenhum Vinho do Porto, faz parte do cotexto histórico essa harmonização!
FA – Bem, Caliandra, estamos a chegar ao fim da nossa conversa. Que vinho escolhes para a partida?
CB – Ahh foi um enorme prazer, compartilhar um pouquinho da minha história com você, foi emocionante reviver em minha memória os momentos que descrevi aqui. Acho que para nos despedirmos, podemos brindar com um vinho do Porto Vintage, para que a nossa conversa fique eternizado não só pelas palavras ditas mas também pelo paladar com o gosto deste vinho excelente.
FA – FA – “Meu bem, sempre que ouvires um lamento / Crescer, desolador, na voz do vento, sou eu em solidão pensando em ti, chorando todo o tempo que perdi…” termina assim Vinícius – e espero que ele não se importe que eu mude o título… tens saudade de Portugal no Brasil?
CB – A saudade é grande sim, quase 6 anos de muito crescimento e aprendizados, Portugal faz parte de mim e da minha história, serei sempre grata por todas as experiencias que vivi ali e pelos amigos que fiz! Mas algo me diz que essa história ainda não terminou e que terei mais capítulos para escrever em terras Lusas… quem sabe?!
Ao dia onze de Maio abre em Portugal mais uma casa Bertrand, e desta vez, na rainha da Costa Verde em pleno centro da cidade um recanto de literatura. Foi uma agradável surpresa há pouco tempo (nos começos da quarentena) ver uma publicação de um amigo com o painel de letras brancas sob um fundo negro na característica calçada da rua 19. É um marco para a cidade, para o concelho e para as áreas limítrofes que assim já não precisam de se deslocar aos centros comerciais das cidades de Vila Nova de Gaia e Porto para assistir a uma apresentação de um livro, ver as novidades e viajar – e é mesmo isso que estamos a precisar.
Devido à situação de Covid – 19, a entrada de clientes está limitada a sete pessoas, e à entrada um boião de gel desinfectante, e foi como se voltássemos a uma casa, encontrámos gente amiga entre as quais Major Nunes da Silva – Presidente da Associação Comercial Viver Espinho. A loja tem muita luz natural e a sua localização não podia ser mais central, está a poucos passos do posto de correios CTT, do Município e dos bancos. A equipa de trabalho é simpática, disponível para esclarecer e ajudar.
Até ao próximo dia 16, (de segunda a sábado), os clientes com cartão Bertrand têm desconto de 20 a 50%, e as novidades com 10%.
Para os aficionados da poesia, tem uma excelente oferta, de Sophia de Mello Breyner a Ruy Belo, passando por Ramos Rosa. Semanalmente haverá um livro (novidade) nas caixas e os sacos reutilizáveis estão por um preço simbólico e são giros, com frases inspiradoras, de Fernando Pessoa.
Nasceu em 1986, na cidade da Maia, romântica, perfeccionista, apaixonada pela natureza e naturalmente pelos livros. Formada em Engenharia Eletrotécnica e Marketing, trouxe ao mundo aos trinta e três anos o “Esquece Quem Eu Sou”. Não a quisemos esquecer e foi com sabor a café e vista sobre o mar que se desenrolou a agradável conversa que agora disponibilizamos. Somos vizinhos e praticamente desconhecíamos, mas há algo que nos une: a criação do zero de uma personagem Rita e de um Ian que prometem fazer sonhar. É apaixonada pela cidade do Porto, fã de Miguel Araújo e quer virar a página na oferta literária “com bolinha vermelha” em Portugal. Sem mais demora, para o Sílabas & Silêncio a primeira conversa de 2020!
(Francisco Azevedo/FA) – Catarina, obrigado teres aceite esta conversa. Se o dia oito de fevereiro fosse um perfume, que aroma teria?
Catarina Gomes (CG) – Frésias.
FA – Deste vida à Rita e ao Ian. Como começou esta viagem literária?
CG – Esta viagem começou em outubro de 2017, num dia comum de férias de Outono em que não havia nada de interessante para fazer. Tinha acabado de ler uma série de romances eróticos ou New Adult, já que eram todos traduzidos, e fui à procura do mesmo estilo escrito em português. Não encontrei nada e não percebia porque é que ninguém escrevia nesse estilo. Então, pus-me a folhear os livros que tinha lido, pensando: “isto são cerca de 300 páginas, não é assim tanto… Ok, eu sou capaz”. Foi assim que nasceu o meu primeiro livro, da vontade de ler mais, e criei esta história para mim, para eu ler. E da vontade de representar um género literário que, em Portugal, é totalmente dominado por autoras americanas e do Reino Unido. Já não escrevia desde a adolescência, a não ser conteúdos científicos!
FA – Recentemente, no Facebook partilhaste um poema – um intemporal de Fernando Pessoa. O amor, para ti é “fogo que arde sem se ver…”?
CG – Quem me dera conseguir pegar nesse poema e reescrevê-lo, sob a minha interpretação. É algo que arde sem se ver, sim, mas não um fogo… é algo mais lento, mais ponderado.
FA – Barbara Walter diz que uma boa pergunta é aquela que a nossa mãe nos ensinou a nunca fazer. Que boa pergunta fizeste hoje? Ou nos últimos dias? Tens sempre resposta para uma pergunta que não gostasses que te fizessem?
CG – Na realidade, não há perguntas desconfortáveis para mim. Além disso, sou demasiado impulsiva, para ter uma resposta treinada.
FA – Determinação e ambição são características da Rita. Em que momentos te revês na personagem principal?
CG – Em todos! Mas, enquanto a Rita é determinada, eu diria que posso ser um pouco “obstinada”, para meu próprio mal.
FA – A Rua de Sá da Bandeira e a “Dama de Copas” têm mais valor para ti desde o dia oito?
CG – Sem dúvida! Tenho um carinho enorme pela Dama de Copas, pelas pessoas que lá trabalham e pela Inês Basek, Margarida Furst e João Coimbra. O dia 8, em Sá da Bandeira (Porto) e o dia 14, em Santa Justa (Lisboa), foram apenas mais um passo que demos juntos, numa jornada onde sinto que eles estão sempre ao meu lado.
FA – As viagens são cruciais para depois no sossego do lar criar uma personagem e viajar por outros mundos?
CG – “Esquece Quem Eu Sou”, baseia-se muito nas minhas vivências na cidade do Porto, aos dias de hoje. Mas, sim, novos lugares ajudam imenso a criar novas personagens e interação entre elas, nesses mesmos locais.
FA – Um romance que “… possui todos os ingredientes para nos envolver…”? Que traços da Rita transportas de forma inconsciente para o teu dia-a-dia?
CG – A sua determinação e perseverança, indubitavelmente. E, aproveito a pergunta para abordar outro tema. A Rita é muito segura, não tem medo de perseguir os seus sonhos, não tem vergonha de dizer o que sente, nem de si mesma. De certa forma, julgo que a maioria dos romances ainda apontam uma mulher insegura e dependente do amor de um homem ou de outra mulher para se afirmar. A Rita não é nada disso! E, subtilmente, quis passar, precisamente, essa mensagem. Todas as mulheres têm direito ao amor, independentemente do seu aspecto físico, da sua profissão, das suas ambições, etc… Acho que é esse o ingrediente que nos envolve. A mulher moderna irá rever-se na Rita; a mulher “antiquada”, quererá ser como ela.
FA – Que livro “com bolinha vermelha” mexeu mais contigo?
CG – Curiosamente, um que tem “bolinha vermelha” literal na capa, mas que não chega aos calcanhares de vários que li que não têm essa marca visível, mas que mereciam. Chama-se “Confia em mim”, de Jennifer Armentrout, uma autora que, na minha opinião, escreve sempre bem, independentemente do estilo.
FA – Em “Todo o azul do mar” há uma passagem que diz “… Foi assim, como ver o mar. A primeira vez que os meus olhos se viram no seu olhar. Não tive a intenção de me apaixonar. Mera distração e já era tempo de se gostar…”. É indissociável o mar do amor?
CG – Esse poema é lindo (olhinhos com corações). Apesar de gostar de alguma poesia, não sou nada poética, pelo contrário, sou muito literal. Portanto, não vejo qualquer relação entre ambos. As pessoas adoram exprimir o amor sob a forma de coisas belas, como o mar, o céu, o universo… sempre em escalas megalómanas! Apesar de adorar a natureza, prefiro descrevê-los através de bens terrenos e vulgares, como “gelatina”, “meias quentes”.
FA – Apaixonada pelas letras desde cedo. Quantos livros tens em casa?
CG – Espera, vou contar! Impressos, 89. O meu problema é não ter uma estante, tenho-os espalhados pela casa.
FA – Passando agora um bocadinho pela arte & ofício da escrita. Preferes o silêncio ou a mesma música?
CG – Silêncio!
FA – Assusta uma página em branco?
CG – Nada! Quer apenas dizer que é hora de começar a escrever!
FA – Criar uma obra do zero nunca é fácil. Que processo não prescindes / levaste em conta para o “Esquece Quem Eu Sou”?
CG – Vou batizar, agora mesmo, um processo de escrita. Chama-se o “processo do prazer puro” de viver noutra casa, noutra cidade, com outras pessoas, frequentar outros lugares.
FA – Foram quantos meses de escrita?
CG – Estás-me a envergonhar, Francisco! Escrita, propriamente dita, e construção da história, cerca de 15 dias com paragem para comer, banho e pouquíssimas horas de sono. Entrei na história de uma maneira que ainda hoje não sei como fui capaz! Depois, precisei de cerca de 1 ano, para limar tudo e dar um fim à história.
FA – A Rita, o Ian, o amor, as incertezas, os cenários… Quanto tempo povoaram a tua cabeça? Já depois do ponto final?
CG – Ainda povoam! 🙂 Adoro aquelas duas personagens, afinal vivi com elas mais de um ano e foram as primeiras.
FA – Não sais de casa sem um livro. Que livro estás a ler? Recomendas?
CG – Estou a ler “O Poder Surpreendente das Ideias Absurdas” e, sim, recomendo, para quem tem receio de sair da caixa, de vez em quando.
FA – As booktubers são muito populares no mercado brasileiro, mas aqui em Portugal há poucas. Quem segues?
CG – Honestamente, nenhuma, ainda. Só há poucas semanas, comecei a dar os primeiros passos no Instagram e conheci algumas bookstagrammers. Penso que ainda temos muito para crescer nesse campo, e, a respeito disso, talvez tenha novidades em breve. 🙂
FA – Se este livro (bonito design da capa!) tivesse uma banda sonora, que dez temas incluirias?
CG – Dez, Francisco!?
– Who are You? – SVRCINA
– Close – Nick Jonas ft. Tove Lo
– Elegy for the arctic – Ludovico Einaudi
– How would you feel – Ed Sheeran
– Antes delas dizer que sim – Bárbara Tinoco
– Tonto de ti – Miguel Araújo
– Hurt for me – SYML
– You – Two Feet
– Fleurie – Breathe
2 Notas
CG – Tenho de aproveitar para dar os parabéns e registar um “Obrigada” ao Gonçalo Cardal Pais, da Emporium Editora, que foi quem desenhou a capa. Não sei o que se passou na cabeça dele, mas é a janela para a história do livro, sem sombra de dúvida, e é a minha cara! Segunda nota: Miguel Araújo, porque o considero um músico e poeta brilhante e porque é da nossa cidade, e que bem que ele a descreve!
FA – Referes no passado dia vinte e um de Fevereiro que “… a melhor parte de escrever um livro é saber que fiz alguém perder a noção do tempo…”. Que sensações um livro precisa de provocar em ti?
CG – Sensação de leveza e despreocupação, sensação de que não existe mais nada à minha volta. Sou só eu e aquelas personagens, num lugar qualquer que estou a visitar pela primeira vez.
FA – Um sonho que gostarias de ver realizado ainda este ano de 2020?
CG – Prefiro falar de objetivos. E, por acaso, prende-se com livros. Espero ver o meu segundo romance terminado, revisto, aprovado pelo meu “grupo privado de pré avaliadoras” e, se correr bem, editado. (Para voltar à Dama de Copas em Fevereiro de 2021).
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